PERFUME DA MORTE

Tantos os vazios no colorido da vida
a lembrar Heidegger: seres à morte,
cujo destino era inventar o mundo.

Mas o mundo se conformou no molde
e se acostumou ao medíocre do banal:
a poesia se perdeu de si e da metáfora
(confusa no revolver de tantos signos
sem símbolos a lançar raio, luz, desejo).

O mundo prêt-à-porter não se inventa:
basta se moldar aos modelos indicados
(tantos sem margem a qualquer outro).

Palácios desabitados de seus estadistas
nada podem ofertar ao futuro humano:
o caminho atônito transborda no vácuo
(muitos os suicidas, fracos, inadaptados:
o mundo se destina aos fortes: só a eles
não há dor na frágil natureza humana –
por que falar em suicídio?: não convém).

Os olhos não suportam olhos pausados
a indagar a refletir a contemplar o outro
– não existe tempo, alucinada vida voraz.

Por que ainda jovem se ocupar da morte?,
não deveria se voltar para o belo do amor?
Eros já não sabe seduzir: se fez pragmático:
de vela na mão a arte não tem interlocutor
exala no mundo o perfume da morte.