Engenheiro Couto Fernandes, arremedo de rua: seis casas e meu mundo e o velho casario encobrindo a lua. Tantos sonhos por lá ficaram dormindo ─ que é próprio dos sonhos dormir ─ Nunca se sonha completamente acordado: e agora que volto a esta esquina tanto anos depois os reencontro, muito embora tantos desistiram e morreram dormindo como anjos: não suportaram […]
Ler maisCIÊNCIA POLÍTICA Os livros de ficção científica não me empolgam: talvez por que sempre fui leitor de ciência política. JUSTIFICATIVA ─ Com a tua popularidade, por que não te candidatas? ─ É que fui reprovado em teste para ator. ETERNIDADE Foi um período de breve (sic) ditadura. COTIDIANO E ARBÍTRIO Nas ditaduras não há gavetas. DESUMANO Nas democracias, o eleitor […]
Ler maisUma fuligem foi embaçando a beleza; uma crosta na retina cegando o povo – logo se viu um país irreconhecível com ídolos ocos e sem horizontes (havia tanta identidade nessa gente). Aonde anda o bruxo do Cosme Velho mais conhecido por Machado de Assis que tinha por ofício coser entrelinhas de fina ironia ao se ocupar do humano? (Harold Bloom […]
Ler maisSENTIDO DA EXISTÊNCIA Pouco importa ser poeta – o fundamental é ser poesia. RESPOSTA DE UM JOVEM POETA ─ Então você quer ser poeta? Primeiro é preciso viver. ─ Viver?…é muito complicado. Não é mais fácil ser poeta? DE REPENTE OLHEI PELA JANELA (…) e a luz espessa da manhã se derramava em brisa sobre a cidade (…) e todos […]
Ler maisVida, descortinar feérico a desafiar nossos limites (carente, pendente, frágil – a poesia e o humano): – aqui estamos estendendo as nossas cálidas mãos a encontrar outras mãos inseguras, gélidas ou cálidas a buscarem nossas mãos frias, vacilantes e solitárias até que todas as mãos se tornem cálidas ao coração. Felicidade, engenho a se reinventar na arte de viver: viver […]
Ler maisEscrevi um epigrama intitulado Algumas inutilidades com o seguinte conteúdo: “Na última faxina encontrei algumas inutilidades: a) carteira de trabalho; b) título de eleitor; e c) um toco de vela”. A minha intenção era bem prosaica: tentei me referir ao desemprego, à minha falta de opção política, igualando a carteira de trabalho e o título de eleitor a um objeto […]
Ler maisÉ necessário algo que mova tudo isso, essa engrenagem enorme a que se chama mundo, e na qual estamos jogados, submersos, imersos em flocos de nuvens, por vezes cinza, triturados pelo relógio, a avenida, o salário – ausentes de nós mesmos – nas promoções dos shoppings mais diversos: a minha, a tua, a vida de Antônio e a de Maria. […]
Ler maisALGUMAS INUTILIDADES a Myllena Lima Falcão Na última faxina encontrei algumas inutilidades: a) carteira de trabalho; b) título de eleitor; c) um toco de vela. ORIGINALIDADE A originalidade resulta de uma trama bem urdida do plágio. SAUDAÇÕES De duas maneiras sou saudado. Uma em qualquer parte do […]
Ler maisO que perece flutua no eterno onde faz silêncio e por isso quem morre é teu vizinho indiferente, o parente muito distante: um homem desconhecido que morava no Méier (que antes de morrer, matou a mulher e o amante é só uma notícia de jornal tão distante de tua vida) A morte, um fantasma que habita nos outros, parece impermeável […]
Ler maisEUFEMISMO A mentira, por vezes, é delicada como um cristal. OXIGÊNIO Sem sonho a realidade morre asfixiada. DISCÍPULO Se Albert Einstein, que era um gênio, dormia 10 horas por dia, devo necessitar ao menos do dobro desse tempo. SÁBIO CONSELHEIRO Escute sempre o silêncio, ele sabe calar os idiotas. CARNE VIVA Quando me ler, cuidado: estou em carne viva. DESPERDÍCIO […]
Ler maisTanta coisa extravia a existência e um dia se perde à eternidade: assim o relógio repete a hora, assim o homem no peitoril, a mulher esquecida na sala. As coisas ao redor nasceram para a morte e soluçam ao ver tanto azul desperdiçado. Veja o dia: esplêndido e vigoroso irá morrer: e ao morrer oferta o crepúsculo em vão. O […]
Ler maisAinda era manhã e os homens começaram a beber. No bar, os homens bebiam e a tarde seguia seu curso, enquanto o relógio funcionava sem questionar as horas e o porquê das coisas. No bar, os homens não viram a noite chegar e servir – de bandeja, a lua – enorme esfera cintilante gritando em amarelo por Van Gogh. No […]
Ler maisPARAÍSO DESOLADO Os humanos fazem a guerra e depois da terra desolada se dedicam à poesia. Sem demora voltam à guerra. Não há dúvida: o destino humano é se perder do paraíso. A BANALIDADE POR VEZES É SONHO Hoje, dia 01.04.2022, todos os habitantes da Ucrânia sonham apenas estar em casa e em paz. TEMPOS SOMBRIOS Há tanto ódio no […]
Ler maisEm pétalas de silêncio, rebentando o mistério vim à luz. O choro do recém-nascido, canto de esperança, se fez música atravessando a noite. Logo veio a manhã de novembro e sol: o céu luzia no ordinário dos dias às margens do rio Mearim, em Bacabal. Todos se moviam nos mecanismos prosaicos do existir e o nascimento de um menino franzino […]
Ler maisDIÁLOGO ENTRE FOFOQUEIROS ERUDITOS — Mas, afinal, me diga: quem foi Shakespeare? — Isso dou de barato. E quem foi Homero? HIPERBOLE Basta uma faísca e o poeta ver um vulcão. CARTA DO SUICIDA ARREPENDIDO Ainda bem que existem as crianças e os loucos. POEMA DO SUSPIRO Ah, vida! LUAR NO TERREIRO DA FAZENDA Eita, João, a lua tem a […]
Ler maisDalí, na cesta de pão, fez a partilha (um quadro com o puro do simples): ali recitou Cristo e o novo testamento sem intentar rituais ou outros dogmas (bastou um gesto terno tal o trigo para alimentar os famintos de vida). Dalí não invocou qualquer teologia: a arte se fez teologia em puro objeto, – a mística da eucaristia no […]
Ler maisNão peço que não me esqueças, seria pedir demais – demasiado: peço que não esqueças de lembrar que não te esqueci ou esquecerei: lembrar é sempre desatar sem fim é misturar os tempos e os mundos, eterno que habita no inconsciente que flana, voa e não pousa nunca – deseja colorir carências e verdades, pois a vida necessita do incompleto: […]
Ler maisQuero o poema de silêncio, reticente, de recalques, dos amores impossíveis, de dores secretas, das almas perdidas: latejando vísceras, comovendo as pedras essência de princípio burilado há séculos nas premissas mais estoicas da filosofia cujo testemunho seja a vida em ofertório de sacrifício entranhado de todo orgulho de não ceder ao seduzir do ar palaciano. Quero o poema de nervos […]
Ler maisOnde estava a musa, quando o poeta guardou aquelas manhãs em florais?, com os olhos de melancolia em fogo (tanta pureza escorria de suas mãos e transbordava em timidez). Estaria a ninfa distraída na manhã?, quando o poeta se guardava atônito disfarçando a melancolia, a timidez sem saber o que fazer com a pureza que escorria encantada de seus olhos. […]
Ler maisSéculo XXI todo fluorescente e opaco, onde ti perdemos, sopro de esperança?, se derrubamos o muro a nos apartar?, aquele que nos legou a esquizofrenia que desenhou o mundo em bipolaridade e nos obrigou a fazer escolhas sectárias desde o dilema capitalismo-comunismo: direitos individuais e sociais em divórcio expiaram em modelos rígidos-imiscíveis; enfim voltamos a nos abraçar desde 1961: chegada […]
Ler maisTantos os vazios no colorido da vida a lembrar Heidegger: seres à morte, cujo destino era inventar o mundo. Mas o mundo se conformou no molde e se acostumou ao medíocre do banal: a poesia se perdeu de si e da metáfora (confusa no revolver de tantos signos sem símbolos a lançar raio, luz, desejo). O mundo prêt-à-porter não se […]
Ler maisEm criança, descobri na pólvora o azul na Santa Inês dos crimes de encomenda. (tantos homicídios, tantos pistoleiros) Naquele tempo não sabia do homicídio (sabia da morte matada e da morrida). Um dia vi a pólvora – era brilhante. (disseram que dela se fazia balas – que depois soube ser munição) Mas a pólvora era azul! (constatei num espanto) E […]
Ler maisa Isabel e Sylvia A casa de batente alto e paredes nuas era toda escancarada para o mundo. A casa tinha porta e o vão da janela (a única janela em plena liberdade): a rua invadia com olhos indiscretos. E durante o dia era o desatar de toda vida: o vendedor de paladar em fatias de bolo, o filho do […]
Ler maisNo dorso da manhã o pássaro acaricia a brisa, as nuvens no quintal dançam prateadas de sol. Em Santa Inês, reino do Vale do Pindaré, a manhã explode em azul para celebrar as laicas esperanças que sobrevivem ao festejar a vida. A vida, essa palavra inútil que não se traduz. A vida clara em uma folha de papel que se […]
Ler maisNa ancestralidade repousa a essência em quietude – tudo está ali pacificado em estado de natureza – não há angústia no primeiro olhar diante do mundo: um deslumbrar macio e puro se desata lentamente. Diante de meus olhos todo o quintal estava por dizer – e pouco importa se meus ancestrais já o disseram – o poço, por exemplo, não […]
Ler maisSim, Clarice, Brasília é artificial na linha do horizonte – acrescentaria: aberta na profundidade dos abismos: o sonho e a vida, algo além de travessias inventadas?, de potências abissais soluçando em busca de sentido? – a vida, esse projeto retilíneo a aprender nas curvas tem tanto a cursar no concreto aventureiro de Brasília, onde as nuvens seduzem a matemática e […]
Ler maisLiberdade e angústia, pautas do gênio que se agarrou à arte para dizer a vida (para não saltar dela antes de saciado e deixar a ela o quanto pode o existir): o ardor do humano em se fazer luz em meio às trevas que dissolvem o sol. Tomar o ser dos abismos mais densos e fazer cintilar a poesia nas […]
Ler maisCONFISSÃO Mario, bem que você me advertiu: “o pior dos problemas da gente é que ninguém tem nada a ver com isso”. Retardatário que sou, por muito tempo entreguei minha alma às pessoas, que se aborreciam delicadamente. Até que percebi: só a literatura – ainda que com a exigência da estética – se interessa pelos nossos infortúnios. VERSÃO SINTÉTICA Deus […]
Ler maisEntrego minha alma ao céu de abril e à rebeldia. (Bandeira Tribuzzi) Joziel, igual a outros tantos homens, nunca pensou em ser notícia de jornal: apenas sobreviver e tentar a felicidade nesse enigma inquieto chamado vida. É verdade que Joziel foi deveras imprudente ao deixar Bacabal, aos 23 anos, sem emprego, com a 4ª série incompleta, com sete irmãos e […]
Ler maisNaquele tempo o mundo flamejava em nossas mãos e nem sabíamos, porque o mistério às vezes é simples – o quanto pode ser simples o mistério da infância –: o dia galopando no dorso alado do ócio todo colorido. O tempo deslizava farfalhando o vazio do nada e a vida não era uma indagação feroz e urgente. (a vida era […]
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