OPACO EM DERIVADAS

De repente o opaco toldou o azul
e o mundo em lúgubre se tornou.

Em verdade não se deu de repente
(eis a tecitura de milhares de anos).

É tapeçaria urdida na complexidade
de natureza de abismos insondáveis.

Estamos, Schopenhauer, na prisão?,
em céu aberto, no vazio do íntimo?

A morte sempre à espreita, em foice,
a descolorir a vida, mostrar seu fardo.

Imersos em agonia, Terra devastada,
para muito além dos versos de Eliot.

Eliot, medita a lição de Schopenhauer:
o mundo é contínuo estado de guerra.

Ainda firme o diagnóstico de Hobbes
com todos os prognósticos em aberto.

A verdade não estaria ao lado de Platão?
(os poetas imitam sem o conhecimento?).

Por vezes declaro a poesia imprestável,
inútil o meu sentido de estranhamento.

Não eras tu o poeta da leveza e da flor,
da brisa, do lirismo em pura banalidade?

Não sabem o que disse Cristo na cruz?
Ó Pai, por que me abandonaste?

Se nossa fragilidade chegasse à espécie,
teria ternura nos olhos, calor nas mãos.

Cristo morreu sem se apartar da beleza
e ainda restam uns poucos nefelibatas,

que fincam barricadas ao pragmatismo
ao utilitarismo, ao cinismo do mercado;

a eles chamamos profetas, poetas, pueris
(eles nada podem, exceto mostrar o azul).

Pensam o mundo em estranhas derivadas
e fazem perguntas assustadoras ao poder:

Quando afinal virá a definitiva revolução?
Sem armas sem mortes sem ódio sem dor,
com os girassóis e nosso batalhão de lírios
e o esquadrão de brisa em flor e açucenas?

Quando então a palavra atingirá a beleza,
o consenso, o amor em delírio cristalino?

Quando não sentiremos mais vergonha
dessa espécie que se perdeu do paraíso?

(ou talvez o paraíso nunca tenha existido:
de mãos apáticas não ousamos erguê-lo).

Quando – embora jogados no infortúnio –
tocaremos o azul no âmago do banal?