PLENO EMPREGO NO MERCADO DA MALDADE
No mundo da maldade há gente capaz de tudo e ainda sobre gente.
ESPARTILHO
A métrica é o espartilho do verso.
A LINGUAGEM DOS OLHOS
Quando adolescente ficava treinando o que dizer às mulheres. Quanta bobagem: as mulheres falam a linguagem dos olhos.
AO MAR
Colocar um poema na internet significa que ele cairá na rede. Prefiro colocá-lo numa garrafa e lançá-lo ao mar aberto.
GALANTEIO
Nunca diga a uma mulher que é poeta, diga que ela é musa.
AMNÉSIA
Quando tua mulher não te recomendar a mesma coisa pela terceira vez com feroz insistência, tenha muito cuidado: é provável que seja os primeiros sinais de amnésia.
DIFERENTES COMPANHIAS
Com o irônico, só a inteligência sorri levemente; com o grosseiro até o constrangimento gargalha.
ROTINA
Não reclama da rotina (…) rotina pior tem o dia, que trabalha todos os domingos e feriados e, via de regra, está sorrindo sem reclamar por férias ou hora extraordinária.
SONHO ETERNO
Quando essa noite acabar, o sonho continua na outra face da Terra.
S.O.S
(…) a borboleta sempre dá leveza e colorido a um poema (…)
INTENÇÕES DE AMANTE
Todas as noites te incluo nas minhas orações e olha que nem sei rezar.
HISTÓRIA
Enquanto o Diário Oficial publica a nova lei, os atos administrativos, a ordem do dia, as comendas e outros títulos honorários, a história continua nos confins do mundo.
PRESSA
Nunca faça nada com pressa, pode ser a última vez.
RELÓGIOS COMOVIDOS
Essa calma das cidadezinhas do interior deixa os relógios comovidos.
SUAVIDADE
Debussy soletrou seu próprio nome ao piano.
FILOSOFIA DA ARTE
a Helena Barbosa
João resmunga a si no meio da lida:
─ Eita, João, que a vida é besta!
─ Mas vai ter forró no sábado!
NÃO IMPORTA
Os relógios de Dali se derramavam ou se derretiam? Bem, nada disso importa à ferocidade do tempo.
DECLARAÇÃO DOS AMANTES
Enquanto encontrar metáfora em ti, meu coração continuará fluindo.
INTELECTUAL
Pelo nível do ensino brasileiro, quem usar óculos será tomado por intelectual.
SOLIDÃO COMPARTILHADA
Estão casados há trinta anos em regime de solidão compartilhada.
REFERENCIAL
Só nos desertos as pessoas podem se encontrar: não há como nas florestas a desculpa das árvores.
CONVERSA FIADA
Fiquei a noite inteira na companhia de um verso que implorou para não ficar preso numa página, pois tinha por destino o prazer da conversa fiada e fez isso com tanta maestria que distraiu a insônia.
FANTASMA
Tenho horror à página em branco: ela é um fantasma que diz verdades insuportáveis.
O SILÊNCIO CRUCIFICADO
Nas igrejas católicas a mais profunda homília é o silêncio no grito de Jesus crucificado.
CURIOSIDADE
Por que nenhum poeta é homem-bomba? Porque a poesia só explode dentro da gente.
TEMPOS PÓS-MODERNOS
Talvez o amor se torne figura de linguagem e a amizade um sentimento primitivo.
NEUROSE
Relógio, instrumento feito para medir a neurose em função do tempo.
SLOW MOVIMENTS
Mozart compreendeu as nuvens e o compasso do azul.
NOTURNOS
Os anjos aprenderam a lira ouvindo os noturnos de Chopin.
BEETHOVEN
Beethoven fez da surdez uma sinfonia.
LEVEZA
(…) a música de Bach, mais leve que o ar, flutua para depois da eternidade (…)
LAVOURA
Com a caneta vou estocando a página em branco, plantando fonemas, ideias e irrigando teus olhos com luz. Se acontecer deles brilhares, fecundou-se a beleza.
ALTA COSTURA
A biqueira, na chuva, colava ao corpo o vestido de Rita, provando a sensualidade da chita.
CHANTILLY
O charme é o chantilly da beleza.
NOTA DE RODAPÉ A UM POEMA
E quando azul o firmamento, para onde as nuvens? Aleijadinho as levou para uma rápida vernissage no céu.
DESPERTADOR SILENCIOSO
O dia gosta de nos acordar pelas frestas, debaixo da porta, das janelas, nos pequenos espaços entre as persianas: o dia é um sedutor.
SURREALISMO PÁTRIO
No Brasil, a lógica constitui elemento do surrealismo e transforma Kafka num Descartes.
BALÉ DAS FORMAS
No ginásio, gostava de me sentar junto à janela para ficar vendo as nuvens: na aula de geometria só eu via o balé das formas deslizando no azul.
SEM VOLTA
Quem veio a Terra e amou, jamais voltará ao pó: será eternamente nuvem ou assobio do vento.
PERDAS
Morremos várias vezes: não notamos, pois em apenas uma delas somos enterrados.
CONTRADIÇÕES DE POETA
Sem palavras não respiro, todavia o que mais comove é ouvir poesia num olhar.
PREOCUPAÇÃO
O que me preocupa não é o fim do livro, mas o aconchego das bibliotecas e daquelas plaquetas solicitando silêncio com a tarde caindo bem devagar.
DO CAMINHO DE VOLTA
Uma lembrança nunca se perde no caminho de volta.
REINO ENCANTADO
O Maranhão esconde seus talentos de tal forma que a poesia atingiu aqui a pureza do anonimato.