Século XXI todo fluorescente e opaco,
onde ti perdemos, sopro de esperança?,
se derrubamos o muro a nos apartar?,
aquele que nos legou a esquizofrenia
que desenhou o mundo em bipolaridade
e nos obrigou a fazer escolhas sectárias
desde o dilema capitalismo-comunismo:
direitos individuais e sociais em divórcio
expiaram em modelos rígidos-imiscíveis;
enfim voltamos a nos abraçar desde 1961:
chegada a hora de construir a fraternidade
e completar a tríade da revolução francesa
(embora nos países periféricos não há sol
– nunca houve sol a cobrir a igualdade –
e por vezes veio eclipse sobre a liberdade).
Mas havia esperança nos olhos do mundo
farto de duas guerras e bombas atômicas;
cansado das ditaduras e tantos cadáveres
que se imolaram no altar estéril das ideais
excludentes do pêndulo radical da política
a prometer a verdade em pureza asséptica
se isso possível fosse ao paradoxo humano.
Fato, século XXI, é que estamos atônitos
a geopolítica ainda gravita no eixo bélico
e o terrorismo te marcou no calendário.
E sem bastar as pautas políticas insolúveis
uma angústia no humano sem precedente
torturando a alma em um planeta sem sol
(a anomia que Durkheim não pôde prevê)
– a indústria farmacêutica, os psiquiatras,
psicólogos, os últimos estadistas, o Papa,
as religiões orientais, a filosofia, as artes,
todos leem o mundo no modo virtual.
Todos se olham perplexos, cabisbaixos,
indagam baixinho, vexados, sussurram:
— O que fizemos de nós, século XXI?