Sim, Clarice, Brasília é artificial na linha do horizonte
– acrescentaria: aberta na profundidade dos abismos:
o sonho e a vida, algo além de travessias inventadas?,
de potências abissais soluçando em busca de sentido?
– a vida, esse projeto retilíneo a aprender nas curvas
tem tanto a cursar no concreto aventureiro de Brasília,
onde as nuvens seduzem a matemática e a arquitetura
(disse Camus: a arte é a expressão da mais alta revolta):
Brasília é um soco no estômago do arcaico brasileiro –
de seu latifúndio, do fosso social, de todo seu medíocre
(por isso Brasília incomoda, revolve a alma, angustia)
Guarda a arte o destino de rasgar os horizontes cinzas
e planar – tal pássaro – comungando o voo do onírico.
Brasília, pássaro de concreto e canto suspenso no ar.