a João Neto
Aprendi o belo no farfalhar das bananeiras
ao som dos pássaros e alvoroço do quintal
– entrecortado de silêncio e brisa infinita –
(principalmente de silêncio em cristal):
silêncio puro sem propósito sem mais nada
(o silêncio que contempla sem indagar,
sem responder: o silêncio que respira):
ali ficava enamorado da brisa fiando o tempo
(e o mundo sem propósito fazia todo sentido).
Deitava entre folhas secas estalando o silêncio
e o chão macio e úmido acariciava meu corpo:
me punha a olhar o balé deslizando nas nuvens
(o belo se encantava onde mais se revelava)
– e ao longe na nuvenzinha apartada das demais
havia um anjinho rosado fazendo piruetas.
O anjinho rosado adorava sestear na nuvenzinha
e vinha me dizer algo para a época indecifrável:
— No escaninho da palavra a poesia não estava.
E ria, ria, ria, porque sabia que eu nada entendia.
Depois voltava e, ainda rindo, completava a joça:
— A poesia não estava onde não se imaginava.
Lembro que lhe perguntei muito intrigado, rindo:
— E onde eu encontro o que tu chamas de poesia?
Ele rindo, rindo, rindo e fazendo piruetas coloridas:
— No olhar absorto de espanto, menino bobinho!
Ao falar o anjinho fazia cócegas no meu ouvido
e dele exalava uma intensa luz azul inquietante.
Ao meio-dia deito e olho absorto as nuvens
(vez ou outra sinto cócegas no ouvido
e um azul inquietante nos olhos).